A construção do autódromo do Rio de Janeiro pode decretar o fim de uma floresta única

No dia 18 de março, às 19h, em audiência pública na quadra do Centro de Formação e Aperfeiçoamento dos Bombeiros, na Av. Brasil, em Guadalupe (RJ), será apresentado a sociedade o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do qual resultou um Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) do futuro autódromo do Rio de Janeiro.

O Biólogo Haroldo Cavalcante de Lima diz que é impossível construir um autódromo no local sem destruir a Floresta Camboatá. Ele espera que seus colegas Biólogos compareçam em massa à audiência pública para defender a preservação da vegetação e fauna da floresta que, para a comunidade científica, encontra-se bastante ameaçada com a possível construção do autódromo.

Haroldo Cavalcante de Lima, graduado em Ciências Biológicas pela Faculdade de Humanidades Pedro II (1977), mestrado em Ciências Biológicas (Botânica) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1987) e doutorado em Ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2000), é pesquisador aposentado do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro e professor do PPG da Escola Nacional de Botânica Tropical. Tem experiência na área de botânica, com ênfase em sistemática e biogeografia, atuando principalmente nos seguintes temas: leguminosa, taxonomia e conservação de plantas da mata atlântica.

Em entrevista ao CRBio-02, Haroldo explica porque esta floresta é tão importante para o Município do Rio de Janeiro e que, portanto, não pode ser substituída por um autódromo.

CRBio-02: O que você está esperando que aconteça no dia 18 de março e como irá se posicionar junto com os seus pares?

HCL: Espero que a comunidade de Biólogos analise de forma criteriosa o EIA-RIMA do autódromo e perceba as falhas existentes, entre outras o fato dele ter sido feito de forma apressada (em dois meses), um período muito curto para realizar os estudos necessários e avaliar com eficácia e eficiência os impactos ambientais. Por outro lado, também, não foi levado em consideração que a Floresta do Camboatá é um fragmento único com mais de 100 hectares de Mata Atlântica em terras baixas no Município do Rio de Janeiro. A área é considerada prioritária para a conservação da biodiversidade pela Portaria 463/2018 do Ministério do Meio Ambiente, sendo indicada como de importância biológica extremamente alta. Sem contar que foram ignoradas as várias espécies ameaçadas de extinção e outras tantas ocorrentes no local. É necessário que a avaliação de impacto seja refeita, corrigindo as inconsistências dos estudos.

CRBio-02: Historicamente, qual a relação do Jardim Botânico com a Floresta do Camboatá?

HCL: A história e os estudos do Jardim Botânico na Floresta de Camboatá começaram em meados da década de 1980, quando o Exército nos pediu para fazer um levantamento da flora existente no local. A solicitação era para identificar todas as árvores. Quando chegamos lá, concluímos que como aquele tipo de floresta, não havia mais nada parecido no Município do Rio de Janeiro, uma vez que praticamente todas tinham sido suprimidas pela expansão da cidade. Em 2012, ouvimos as primeiras notícias sobre a intenção de construir um autódromo na área da floresta, quando o Ministério Público Estadual solicitou à Diretoria de Pesquisas do Jardim Botânico um parecer de avaliação sobre a vegetação e flora deste extremamente importante remanescente de Mata Atlântica.

CRBio-02: Qual a importância desta floresta para a comunidade científica e população local?

HCL: A Floresta de Camboatá é um fragmento de grande importância por guardar uma biodiversidade significativa e ser a última floresta remanescente de terras baixas em nossa cidade. Além disso, a área é estratégica para a conectividade entre os maciços da Serra Branca, Tijuca e Gericinó-Mendanha, favorecendo a ocorrência de fluxo gênico entre as populações de plantas e disponibilizando local de pousio para avifauna. Tem ainda alto potencial para restaurar as florestas degradadas do município, principalmente para coleta de sementes e produção de mudas de espécies características deste tipo de floresta. Por outro lado, sabe-se que os bairros do entorno já são extremamente desprovidos de áreas verdes e a supressão da floresta certamente promoverá elevação na temperatura local e o aumento das inundações. Portanto, é evidente que área tão sensível deve ser prioridade máxima na política ambiental e urbanística do município, associando a sua conservação com usos que ofereçam oportunidades de negócios sustentáveis e melhoria na qualidade de vida de bairros com baixíssimo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

CRBio-02: Na sua opinião quais foram os motivos de escolherem justo o local da floresta para a construção de um autódromo? Haveria outros locais na região? Quais?

HCL: É provável que os interesses econômicos influenciaram na escolha. Todo o processo de licenciamento vem sendo realizado de forma açodada, amparado pela divulgação na mídia de que o empreendimento obedece exemplarmente a legislação ambiental. Entretanto, uma simples análise do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) demonstra claramente como foram subestimados os impactos e os custos da mitigação. Os critérios usados para comparar as diferentes áreas alternativas para a construção do autódromo são tendenciosos e escolhidos com a intenção de manipular a avaliação dos impactos ambientais, sociais e econômicos. Outros locais próximos bem mais adequados, tais como os campos do Gericinó, o aterrado do Leme e o terreno da Ambev, possuem cobertura vegetal antropizada e praticamente desprovidas de vegetação arbórea. Os Biólogos que exercem a profissão na cidade do Rio de Janeiro precisam apoiar esta causa, não é sensato destruir a Floresta do Camboatá para construção de um autódromo. Ele poderá ser construído em outro local.

 

Copyright ©2019 CRBio-02 | Conselho Regional de Biologia | 2ª Região RJ/ES